Não podemos pensar em The Dark Knight como um filme isolado, ou uma sequela de Batman Begins. Tem as suas particularidades, que o tornam único... gigante até, mas não o poderemos ver apenas como o seguinte. A história que conta o início, mostra-nos que o maior inimigo de Batman é ele próprio, a dualidade entra vingança e justiça, bem como a definição desses conceitos, no fundo prepara Bruce Wayne, para aquilo que temos neste filme. Para isso, Nolan e Goyer não cairam na tentação de escolher inimigos que fossem capazes de ofuscar Batman, mantendo como já disse os pés bem assentes na terra. A prioridade aqui, não era a sua guerra Ras Al’Gul/Scarecrow mas sim a sua batalha interna. Para além do mais, o final é claro: o maior inimigo de Batman está para chegar. É caso para dizer... as “cartas” estão lançadas.
Joker é o maior inimigo de Batman. Se no filme anterior havia o tema de vingança e o tema de Justiça onde Ras Al’Gul é a vingança e Rachel Dawes a Justiça, que Bruce Wayne alterna entre os dois ao longo do filme, com Joker isso não existe. Se Batman é Justiça e define-se por um conjunto de regras que o levam a praticar o que considerado certo, Joker é a Anarquia. Se o primeiro for harmonia o segundo é o Caos! Se um é o constante o outro o inconstante. Sem escrúpulos ou preocupações Joker é a desordem, a raiva, caos, loucura e anarquia contidas numa única personagem. Ao longo do filme, ficamos sem saber se havemos de rir ou se o horror nos assolou. Assim é o Joker de Heath Ledger. Um Ledger, que de tão brilhante, acaba por roubar todos os momentos em cena. Desengane-se quem pensar que é uma declaração por simpatia. Não o é. Com o que vi? Nunca o poderia ser.
Aaron Eckhart dá vida ao nobre Harvey Dent. A sua actuação é do melhor que este filme tem para oferecer. Se não é o melhor é porque o Joker de Ledger é apenas algo de extraordinário. Harvey representa o herói que Batman não é nem poderá nunca ser. É o herói que tem uma cara, que luta pelo seu povo, que tem o apoio e simpatia de todos. No entanto sobre uma transformação física e psicológica de tal forma que altera por completo o rumo da sua persongem (a soma de Batman e Joker num só), revelando a versatilidade de Eckhart como um excepcional actor.
Christian Bale é Batman e não outro a quem figure melhor a personagem. Neste filme não dá tanto nas vistas, mas a culpa não é dele, é do Joker. Maggie Gyllenhall dá uma outra dimensão ao papel de Rachel Dawes, que Katie Holmes tratou como pode. Morgan Freeman e Michael Caine acrescentam às personagens o charme e o carisma que lhes é reconhecido enquanto actores, aplicando-se o mesmo a Gary Oldman. Tivemos inclusivamente direito a pequenas actuações de Anthony Michael C. Hall (The Dead Zone), de William Fichtner (Prison Break) e até de Nestor Carbonell (Richard em Lost), que só acrescentam a classe a este já grande filme.
A história foi desenhada por Goyer (o mesmo que nos trouxe a maioria dos argumentos de filmes baseados em BD, inclusivamente a direcção de Blade Trinity) e transformada em argumento pelos irmãos Nolan. Esta trindade nunca cedeu a tentações fáceis e navegou o argumento com precisão e classe. Nunca se explica porque Joker existe ele apenas é. Como o nosso amigo JB disse e muito bem “As forças da natureza não se explicam”. Christopher Nolan já conhecemos e sabemos o que sabe fazer com a camera. Desde as sequências brutais de perseguições com o Batmoblie e “Motamobile” à fuga de Batman no Japão, não há melhor arte em movimento do que esta. Nolan é ainda brilhante o suficiente para homenagear o Batman de Tim Burton em pelo menos duas cenas. Mas foi sobretudo a conjugação do tema presente neste filme, que acaba por definir este grande realizador. Não acho que o grande tema deste filme seja novamente uma dualidade entre cair no caos de Joker ou seguir o caminho por si já definido. Nolan deu o passo seguinte e depois da Justiça, trouxe-nos o poder do sacrifício.
Foi com essa perspectiva, com a morte de Ledger e com a fantástica campanha viral que chegamos às portas de Gotham uma vez mais. Os mais cépticos afirmam hoje que o filme foi demasiado cotado, mas não foi. Vi o melhor e maior filme de super-heróis alguma vez feito. “The Dark Knight” deve ser de ora em diante, a formula de todos os filmes deste género. É uma ode ao cinema, onde de uma vez por todas se prova que não é preciso ser experimental ou versar sobre um tema polémico para ser um filme extraordinário e digno de Óscar.
10/10